Blog do Prof. Dr. Paulo Cardim nº 611 de 11 de dezembro de 2023.

Pisa & PNE: ensino médio X aprendizagem

O Pisa é um estudo comparativo internacional, realizado a cada três anos pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). O programa avalia o conhecimento e as habilidades dos estudantes na faixa etária de quinze anos em Matemática, Leitura e Ciências. O Inep é o responsável pelo planejamento e a operacionalização dessa avaliação no Brasil, desde 2000.

É o mais importante estudo comparativo do mundo nas áreas avaliadas. Participaram do Pisa-2022 81 países, com a avaliação de 10.798 estudantes de 599 escolas brasileiras das redes pública e privada dedicadas ao ensino médio. A aplicação no Brasil foi digital, com exceção dos questionários de responsabilidade dos pais.

O Inep divulgou o perfil dos participantes: 3,1% dos estudantes da rede estadual; 81,9% dos matriculados no ensino médio; 96,5% das escolas localizadas em área urbana; e 76,4% das escolas situadas no interior. As médias brasileiras de 2022 foram praticamente as mesmas de 2018 nas áreas avaliadas. Segundo o Inep, desde 2009, os resultados são estáveis nas três áreas, com pequenas flutuações. Mas, “apesar da média da OCDE ser, nesta edição de 2022, a menor de toda série histórica (desde 2000), os estudantes do Brasil obtiveram pontuação inferior a ela nas três disciplinas”. Ou seja, nesses últimos 23 anos não houve nenhuma melhoria na qualidade do ensino médio no Brasil.

Segundo análise do Inep, o Brasil apresentou, em Matemática, um desempenho médio de 379 pontos em matemática. A pontuação é inferior à média do Chile (412), Uruguai (409) e Peru (391). Não há diferença estatisticamente significativa entre a média brasileira, da Colômbia (383) e da Argentina (379). Pelo menos nesse desempenho pífio, o Brasil está de mãos dadas com a Argentina.

Em Leitura, o desempenho médio dos estudantes brasileiros alcançou 410 pontos. Nessa área o Brasil vence a Argentina por nove pontos: 410 x 401, mas inferior ao Uruguai (430). A pontuação é estatisticamente inferior à média do Chile (448) e Uruguai (430), mas superior à da Argentina (401). Não há diferença estatisticamente significativa entre a média brasileira, da Colômbia (409) e do Peru (408).

Dos estudantes brasileiros, 50% tiveram baixo desempenho nesta disciplina (abaixo do nível 2). Entre os países membros da OCDE, o percentual dos que não atingiram este nível foi de 26%. Somente 2% dos 10.798 brasileiros atingiram alto desempenho em leitura (nível 5 ou superior).

Na área de Ciências, o desempenho médio brasileiro foi de 403 pontos, resultado inferior às médias do Chile (444), Uruguai (435) e da Colômbia (411). Novamente o Brasil está ao lado da Argentina, em último lugar.

Os resultados do Pisa/2022 podem contribuir para o estabelecimento de metas, estratégias e ações do Plano Nacional de Educação (PNE), de duração decenal (PNE/2024-2034).

O Presidente da República editou o Decreto n. 11.697, de 11 de setembro de 2023, para convocar, em caráter extraordinário, a Conferência Nacional de Educação (Conae), a ser realizada nos dias 28, 29 e 30 de janeiro de 2024, a fim de propor estratégias, ações e metas para o 3º plano decenal de educação (PNE-2024/2034).

Concluída a Conae/2024, o Ministério vai analisar as propostas e elaborar um anteprojeto de lei, a ser submetido ao Ministro da Educação. Caso este aprove, enviará o texto ao Presidente da República, com a proposta de Mensagem ao Congresso Nacional. O PNE 2014/2024, tem vigência até junho de 2024, nos termos da Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014, que aprova o Plano Nacional de Educação (PNE-2014/2024). Dificilmente o Congresso aprovará o PNE 2024/2034 até junho de 2024.

O Plano Nacional de Educação (PNE), de duração decenal, é uma exigência do art. 214 da Constituição, nos seguintes termos:

“Art. 214. A lei estabelecerá o plano nacional de educação, de duração decenal, com o objetivo de articular o sistema nacional de educação em regime de colaboração e definir diretrizes, objetivos, metas e estratégias de implementação para assegurar a manutenção e desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis, etapas e modalidades por meio de ações integradas dos poderes públicos das diferentes esferas federativas que conduzam a (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 59, de 2009)I – erradicação do analfabetismo; II – universalização do atendimento escolar; III – melhoria da qualidade do ensino; IV – formação para o trabalho; V – promoção humanística, científica e tecnológica do País; VI – estabelecimento de meta de aplicação de recursos públicos em educação como proporção do produto interno bruto. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 59, de 2009)

O PNE 2014/2024, em vigor, passou pela gestão de quatro presidentes da República. É uma peça de fantasia elaborada no Ministério da Educação: não erradicou o analfabetismo, não promoveu a melhoria do atendimento escolar e nem a qualidade de ensino; a formação para o trabalho está presente nos cursos técnicos e tecnológicos, sem qualquer estímulo dos poderes públicos; idem a promoção humanística, científica e tecnologia.

O Partido dos Trabalhadores (PT) e seu puxadinho, o MDB, governaram o país durante dezesseis anos consecutivos. Após 2003, nenhum dos presidentes pode reclamar da famosa “herança maldita”. Nenhum dos PNEs aprovados nesses anos cumpriu o art. 214 da Constituição. As metas e estratégias, na maioria delas, não coadunavam com a realidade da educação pública, em todos os níveis.

E agora, com o mesmo Presidente 2003 a 2010, será diferente? Creio que não. O MEC promoveu um Ciclo de Webinários, prévio à Conferência Nacional de Educação (Conae) 2024. Em um deles, o tema foi “Acesso, qualidade (ensino, pesquisa e extensão), avaliação e equidade no ensino superior”.

O Encontro foi organizado pela Secretaria de Articulação Intersetorial, com a participação dos Sistemas de Ensino (Sase), como preparação para a Conae 2024, disponível no Canal do MEC no YouTubeNão houve a participação de representante de nenhuma das entidades ligadas à educação básica e à educação superior de livre iniciativa.

Marcilene de Souza, coordenadora-geral de Planejamento e Avaliação da Educação Profissional e Tecnológica do MEC, “acha” que é “muito importante refletirmos sobre esses aspectos, porque estamos falando aqui de algo fundamental na educação, que é acesso e permanência. Estamos falando de equidade. A educação superior ainda é um espaço muito privilegiado, não obstante a aprovação das políticas de ações afirmativas”. E disse que “é fundamental pensar nesses aspectos do ponto de vista da história do Brasil — de colonização; de escravização dos indígenas e da população negra; e de genocídio dos indígenas”. 

A política de cotas, ignorando o mérito, já atende a esse aspecto. Creio que o objetivo é o aumento dos percentuais das cotas. Esquece a professora que o problema é, na realidade, a má qualidade de ensino-aprendizagem por conta dos governos federal, estaduais e municipais. O sistema federal de ensino não existe, na realidade. A educação básica pública de qualidade não existe (salvo as exceções); e não prejudica somente indígenas e negros, mas os pobres de qualquer raça ou cor, como preferirem. O PNE, por si só, não vai corrigir essa fragilidade quase que absoluta das escolas estaduais e municipais. Sem qualidade na educação básica pública todos os ingressantes pobres ou abaixo da linha de pobreza deveriam receber cotas. As universidades públicas devem ampliar a oferta de cursos noturnos para o atendimento dos estudantes que trabalham.

Essa estratégia de tentar dividir artificialmente o Brasil em raças e classes sociais é antiga, vem do marxismo e do leninismo. Querer usar essa estratégia em um processo que pretende aprovar o PNE 2024/2034, ofertar caminhos para uma educação de qualidade não me parece uma estratégia de uma educadora. De uma militante é possível.