Blog do Prof. Dr. Paulo Cardim nº 622 de 22 de abril de 2024.

Liberdade acadêmica e de expressão: um diálogo para o momento

Roberto Lôbo, PHD em Física, ex-reitor da USP e de uma universidade da livre iniciativa − Mogi das Cruzes −, ex-diretor do CNPq, fundador e presidente do Instituto Lobo e pesquisador sênior do IEA/USP, em artigo publicado no Estadão de 19 do corrente, sexta-feira − Liberdade acadêmica e liberdade de expressão O que as une e o que as separa? −, pretende iniciar um diálogo com os pensadores e gestores da educação superior brasileira sobre essa temática, de acordo com a realidade brasileira.

O artigo é baseado em debate que está acontecendo nas universidades norte-americanas sobre essa temática. Aceitamos a iniciativa dele e vamos abordar o assunto tendo presente a Constituição, a LDB e as diretrizes e normas administrativas do Ministério da Educação (MEC).

A Constituição 88, vigente, apesar do STF, dispõe o seguinte sobre esses dois temas, nos artigos 206 e 207, a seguir transcritos nas partes referentes ao referido debate:

“Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

I – […];

II – liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber;

III – pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;

IV – […]. (gn)

Art. 207. As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão.

A pesquisa. O inciso II do art. 206 trata da “liberdade de aprender, ensinar, pesquisar” e “divulgar o pensamento, a arte e o saber”, naturalmente, como resultado das pesquisas realizadas. Os projetos de pesquisa são aprovados pelos órgãos competentes, na forma da legislação brasileira.

O ensino. Este é desenvolvido segundo o Projeto Pedagógico de Curso (PPC) e os planos ou programas aprovados pelo órgão competente de cada universidade − Estatuto, Regimento Geral − ou qualquer deliberação, em instância final, dos órgãos colegiados superiores. Nas faculdades e congêneres há somente o Regimento.

Esse procedimento, de acordo com as regras administrativas do Ministério da Educação (MEC), é obrigatório e objeto de avaliação in loco ou dos apelidados “indicadores de qualidade“ criados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira (Inep): CPC (Conceito Preliminar de Curso) e IGC – Índice Geral de Cursos.

O Estatuto e o Regimento Geral de universidades e centros universitários, públicos ou da livre iniciativa, são aprovados no ato de credenciamento pelo MEC.

O Projeto Pedagógico Institucional (PPI) e o Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) completam os ordenamentos institucionais dessas obrigatórias para instituições universitárias e faculdades, segundo as normas administrativas do MEC.

Cada curso superior há de possuir, obrigatoriamente, o Projeto Pedagógico de Curso (PPC), que contempla todo o arcabouço de cada curso, devendo ser aprovado pelo órgão competente das instituições universitárias ou não.

Nas instituições da livre iniciativa deve haver o contrato de trabalho, além da carteira profissional, dos docentes e contrato de prestação dos serviços educacionais com os estudantes, pais ou responsáveis. Neles, as IES particulares podem inserir direito e obrigações que não conflitem com a Constituição e legislação vigente.

A chamada “liberdade de cátedra” não existe mais. Foi eliminada pela Reforma Universitária de 68, com base nos modelos universitários dos EUA e da Alemanha. A Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, a LDB, não restabeleceu a liberdade de cátedra.

O art. 2º da LDB dispõe que “A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”. (gn)

O art. 3º diz que “O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: I – […]; II – liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber; III – pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas; [..]. “Liberdade de aprender, ensinar e pesquisar”, dentro dos princípios legais aprovados pelo Estado brasileiro (Congresso e Presidência da República). As concepções pedagógicas estão delineadas no PPI, PDI e PPC. (gn)

A artigo do professor Roberto Lobo serve de alerta para as IES da livre iniciativa, que não são concessão do Estado. Mas só podem funcionar mediante autorização (credenciamento) dos poderes públicos e avaliação, nos termos da Constituição e do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior, o Sinaes – Lei nº 10.861, de 14 de abril de 2004.

A realidade norte-americana, na área da educação superior, difere radicalmente da brasileira. Todavia, o alerta é válido para a reflexão das IES da livre iniciativa que atuam na educação superior brasileira.

De acordo com  o Censo da Educação Superior 2022, das 2.595 IES, 2.283 são da livre iniciativa; total de matrículas: 9.443.597, sendo 2.076.517 nas públicas (federal estadual e municipal) e 7.367.080 nas particulares.

Temos, portanto, 2.283 empreendedores da livre iniciativa que podem e devem participar dos diálogos relativos ao tema trazido a público pelo professor Roberto Lobo, conceituado professor, pesquisador e gestor acadêmico com ampla e longa experiência na área da educação superior.