Blog do Prof. Dr. Paulo Cardim nº 593, 07 de agosto de 2023

Leis & educação de qualidade

Na última semana de julho, foram publicadas, pelo menos, três leis que alteram ou pretendem complementar a LDB. Essa é uma tradição brasileira. Os legisladores e executivos pensam que a qualidade da educação pública depende de leis, decretos e similares. Uma delas institui o Programa Escola em Tempo Integral.

O Centro de Referência em Educação Integral, reconhece que a educação deve ser desenvolvida, de preferência, em escolas de tempo integral. A educação integral é “uma concepção que compreende que a educação deve garantir o desenvolvimento dos sujeitos em todas as suas dimensões – intelectual, física, emocional, social e cultural e se constituir como projeto coletivo, compartilhado por crianças, jovens, famílias, educadores, gestores e comunidades locais”.

As avaliações oficiais do ensino médio e as independentes, como o Pisa, promovido periodicamente pela OCDE, demonstram a fragilidade da educação básica pública brasileira. O Pisa é um programa de Avaliação Internacional de Estudantes, que mede a capacidade dos alunos de quinze anos de usar seus conhecimentos e habilidades em leitura, matemática e ciências “para enfrentar os desafios da vida real”. Os resultados em relação aos estudantes brasileiros não são nada animadores, desde que o Brasil passou a integrar o Pisa.

As avaliações desenvolvidas pelo Exame Nacional do Ensino Médio – Enem não mais correspondem à qualidade desse nível educacional. A sua transformação em vestibular para ingresso nas universidades federais descaracterizou essa modalidade de avaliação, com a interferência dos “cursinhos”.

Apenas um pequeno exemplo. A Meta 3 do Plano Nacional de Educação (PNE-2014/2024), por exemplo, pretendia universalizar o ensino médio até 2016 ao atendimento escolar para toda a população de quinze a dezessete anos de idade e elevar, até o final de vigência do PNE (junho de 2024), a taxa líquida de matrículas no ensino médio para 85%. Para o percentual da população de 15 a 17 anos que frequenta a escola ou já concluiu a educação básica, a Metaprevia 100%, mas a realizada foi apurada em 84,3%.ParaoIndicador “Percentual da população de 15 a 17 anos que frequenta o ensino médio ou possui educação básica completa”, a meta é de 85%, mas a realizada ficou em 55%. E o PNE está no seu último ano de vigência, termina em junho de 2024.

Temos um exemplo de fracasso de educação em tempo integral no Estado do Rio de Janeiro. O professor Darcy Ribeiro.  A Rede Brasil Atual tem uma frase que traduz o problema: “Os Centros Integrados de Educação Pública foram criados em 1983, no primeiro governo Brizola, influenciado por Darcy Ribeiro. Mas a educação de qualidade oferecida aos filhos da classe trabalhadora não sobreviveu ao pensamento de que ao pobre basta uma educação pobre”.

Os Cieps (Centros Integrados de Educação Pública), apelidados de Brizolão, como forma de divulgar Leonel Brizola em sua campanha à Presidência da República, foram um projeto educacional do então secretário do Governo Brizola, Darcy Ribeiro, que tinha por objetivo promover ensino público de qualidade e em tempo integral. O projeto arquitetônico era do arquiteto Oscar Niemeyer. Foram erguidas cerca de quinhentas unidades, espalhadas pelo território fluminense.

O professor Darcy Ribeiro chegou a classificar o seu projeto como “uma revolução na educação pública no Brasil”. O presidente Collor iniciou a implantação do mesmo projeto, mas sem qualquer característica. Foi apenas um projeto político fracassado. Essa “revolução” durou pouco. Há muito, os Cieps são escolas comuns, em tempo parcial.

Leis e projetos para “revolucionarem” a educação básica surgem de forma mágica, pela brilhante ideia de um teórico da educação ou de um político populista. Chegam e somem, sorrateiramente. E os estudantes continuam a ter uma educação pública de baixa qualidade, com fragilidades flagrantes, como escolas em baixo de árvores, de “pau a pique” ou meros galpões.

Esse pequeno e simples exemplo demonstra que o templo integral na educação média, um dos fatores que pode influir na boa qualidade do ensino médio, não é suficiente. Outros fatores são preliminares a essa política aligeirada, tais como: capacitação docente continuada; acolhimento diferenciado para os estudantes de famílias que estão da linha da pobreza ou abaixo dela, com apoio financeiro para as despesas de transporte, alimentação, material escolar; biblioteca em todas as escolas, com atualização do acervo físico e virtual; espaço de aprendizagem adequado ao nível de ensino; plano de carreira docente, com remuneração adequada; avaliação específica de desempenho docente periódica; avaliação discente presencial, com indicadores de qualidade universal.

Menos leis “que não pegam” e mais efetivas ações que possam, realmente, melhorar substancialmente a qualidade da educação básica pública. Esse tema é recorrente neste Blog por observarmos, pesarosamente, a marginalidade a que são abandonados crianças, adolescentes e jovens da população pobre ou de situação de vida miserável. Há políticos que chegam a afirmar que “governar para pobre é fácil”. Pensam que circo e pão resolvem o problema. A pobreza mental desses políticos é o espelho da classe. A educação para eles nunca foi e nem será prioridade, assim como os demais serviços públicos, em particular, transporte e saúde.