Blog do Prof. Dr. Paulo Cardim nº 591, 24 de julho de 2023

Educação, qualidade & desenvolvimento

Inúmeros filósofos, pedagogos, educadores alertam que a educação constrói o mundo, promove o desenvolvimento socioeconômico. Sim, a educação é a mola propulsora do desenvolvimento socioeconômico de qualquer país civilizado. Mas qual educação? Essa pergunta, que parece inoportuna, é congruente com os tempos que temos vivido nestes últimos trinta anos. A educação básica, prioritariamente, ofertada pelo Poder Público – federal estadual e municipal – apresenta uma fragilidade há anos. E a queda continua, como demonstra uma avaliação internacional promovida pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE, em 2018, por meio do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa).

A educação pública, nesses tempos, tem se caracterizado pela militância nas escolas, ferindo seriamente os princípios constitucionais. Essas ações, com as exceções de praxe, têm comprometido o processo ensino-aprendizagem, gerando analfabetos funcionais e uma baixa produtividade. A má qualidade da educação básica, conduz ao ensino médio estudantes com graves deficiências de aprendizagem. Essa educação remete ao ensino superior estudantes que, nem sempre, conseguem companhar os estudos nesse nível. Esse fato é um dos responsáveis pelo decréscimo de demanda à educação superior e pela evasão nos primeiros anos de estudos.

As famílias de baixa renda ou abaixo do nível de pobreza, mesmo com o Prouni, enfrentam outras dificuldades para a manutenção dos filhos na educação superior, como transporte, alimentação, livros e outros materiais escolares. Outra causa da queda na demanda à educação superior.

Qual educação serve ao Brasil, à sua população? Uma educação de qualidade, com o expurgo da militância ideológica, em todos os níveis educacionais. Mas a atual política governamental para a educação oferece caminhos que não sinalizam para esses princípios fundamentais. Esse fato impede o “pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho” e a garantia de padrão de qualidade, como reza o art. 205 da Constituição.

O artigo “Educação, capital do conhecimento e crescimento econômico” (Education, knowledge capital, and economic growth), de autoria de Eric A. Hanusheka – economista norte-americano, especializado em economia da educação, professor da Universidade de Stanford – e  Ludger Woessmann – economista alemão, professor de economia na Universidade Ludwig Maximilian, de Munique e um dos principais economistas da educação do mundo – revela que grande parte da diferença entre as taxas de crescimento econômico de longo prazo dos países pode ser explicada por diferenças na qualidade da educação oferecida à sua população. Assim, não há prosperidade duradoura em uma sociedade sem a oferta de uma educação de qualidade.

A qualidade da educação pode ser mensurada a partir da satisfação do cliente – o educando – e da avaliação da aprendizagem. Esta, contudo, tem aspectos burocráticos que não conduzem aos fins desejados. Sei que o tema é polêmico, que não há consenso, mas a minha atuação à frente da Belas Artes e de entidades que congregam instituições de educação superior (IES) da livre iniciativa ensinou-me relativamente bem na definição de qualidade.

João Catarin Mezomo, em “Educação e qualidade total: a escola de volta às aulas” (Petrópolis: Vozes, 1997, p. 46), afirma que “qualidade é uma propriedade de um produto ou serviço que o torna adequado à missão de uma organização comprometida com o pleno atendimento das necessidades de seus clientes”, no caso, o educando.

O Exame Nacional de Desempenho do Estudante – Enade, único no planeta, por exemplo, não avalia em condições ideais a aprendizagem. O Enade é obrigatório para o aluno, mas ele pode apenas estar presente, responder total ou parcialmente as questões ou não responder a nenhuma. Nesses casos, o resultado não reflete nenhuma avaliação real.

O Exame Nacional do Ensino Médio – Enem é outro exemplo de avaliação inadequada, a partir do momento em que foi transformado num vestibular ou processo seletivo à educação superior. Por esse desvirtuamento de sua finalidade, veio a reintrodução dos cursinhos no treinamento para o acesso a cursos de graduação. Não se avalia mais a aprendizagem no curso regular.

A qualidade na visão de Peter Drucker, o guru da administração, engloba o gerenciamento e a inovação, ambos com disciplina e avaliação contínua para a possível correção de estratégias, ações e metas. O Projeto Pedagógico Institucional (PPI) e o Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) devem passar por avalição, no mínimo, anual. À definição de Missão, Visão, Princípios e Objetivos institucionais deve estar associada ao projeto de avaliação institucional interna de cada IES. Por outro lado, as avaliações externas, conduzidas pelo Ministério da Educação, subordinadas à Lei nº 10.861, de 14 de abril de 2004, que institui o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior, o Sinaes, devem ser objeto de acompanhamento e avaliação pela Comissão Própria de Avaliação (CPA) de cada IES, a fim de corrigir distorções próprias desse sistema.

O assunto é polêmico, complexo e merece a atenção e o envolvimento de todos os profissionais da educação, em especial, os que atuam nos mais diversos postos nas IES particulares.