Diploma de graduação & exercício profissional
A Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, a segunda LDB, dispõe, no art. 48, que “os diplomas de cursos superiores reconhecidos, quando registrados, terão validade nacional como prova da formação recebida por seu titular”. Essa redação põe termo à vinculação entre diploma e exercício profissional.
A primeira LDB, a Lei nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961, no art. 68, determinava que “os diplomas expedidos pelas universidades ou pelos estabelecimentos isolados de ensino superior oficiais ou reconhecidos serão válidos em todo o território nacional”. E o parágrafo único dizia que “os diplomas que conferem privilégio para o exercício de profissões liberais ou para a admissão a cargos públicos, ficam sujeitos a registro no Ministério da Educação e Cultura, podendo a lei exigir a prestação de exames e provas de estágio perante os órgãos de fiscalização e disciplina das profissões respectivas”, ou seja, vinculava o exercício de profissões liberais ao diploma de nível superior. Esse dispositivo, no entanto, foi revogado pelo Decreto-Lei nº 464, de 1969, dando validade ao art. 18 da Lei nº 5.540, de 28 de novembro de 1968, a Reforma Universitária de 68, que dizia: “Além dos cursos correspondentes a profissões reguladas em lei, as universidades e os estabelecimentos isolados poderão organizar outros para atender às exigências de sua programação específica e fazer face a peculiaridades do mercado de trabalho regional”. Toda essa matéria foi revogada pela Lei nº 9.394, de 1996.
Como afirmei acima, a atual LDB desvincula o diploma de graduação para o exercício de profissões liberais, exceto para as que possuem legislação específica sobre o assunto, como o Direito, por exemplo.
A tradição brasileira é a regulação do exercício de profissões mediante leis. Todavia, existem profissões como, por exemplo, as ligadas às tecnologias da informação – informática – que não exigem diploma de graduação. Nesse e nos casos similares, o diploma tem por objetivo declarar a “formação recebida por seu titular”. Essa diferença, todavia, não retira do diploma de graduação a relevância que tem na formação profissional, até porque ele permite a continuidade dos estudos, por exemplo, nos cursos de pós-graduação lato senso, em nível de especialização. Algumas corporações não exigem o registro de especialização nas diversas áreas, como a OAB. Os bacharéis em Direito que sejam filiados à OAB podem fazer a pós-graduação lato sensu em determinadas áreas, como direito civil, penal, trabalhista, empresarial. A especialização confere a esses profissionais um diferencial competitivo, sem necessidade de obter o registro. Já o Conselho Federal de Medicina exige o registro para a divulgação de especialidades médicas, mediante formação pós-graduada e/ou certificação pelas diversas sociedades de especialização médica.
Tramita na Câmara Federal, projeto de lei do deputado Tiago Mitraud (Novo/MG) − Projeto de Lei nº 3081/2022 – que revoga sete decretos-leis, 75 leis e partes de três normas que tratam da regulamentação de 106 profissões. O texto está em análise na Câmara dos Deputados. A proposta pretende desregulamentar “atividades que não oferecem risco à segurança, à saúde, à ordem pública, à incolumidade individual e patrimonial”. Em entrevista concedida à Agência Câmara de Notícias, o parlamentar afirma que “Ao impor barreiras de entrada [por meio de regulamentação], o exercício profissional fica limitado a condições que, muitas vezes, não refletem critérios que, de fato, tornam a prática mais segura”. O deputado cita, na justificativa, Frédéric Bastiat, economista, filósofo, jornalista e político francês, no livro “O que se vê e o que não se vê” (São Paulo: Montecristo, 2021). Em meio à ascensão de ideias socialistas contrárias à liberdade e à propriedade privada, Bastiat voltou seus esforços para a divulgação e a defesa dos princípios liberais.
Segundo o deputado Tiago Mitraud, “o Projeto de Lei tem o objetivo de remediar uma distorção criada pelo ordenamento vigente. É usual acreditar que certas profissões devem ser regulamentadas a fim de que se assegure a qualidade do serviço. No entanto, devemos analisar a situação de modo a balizar seu real impacto. Ao impor inúmeras barreiras de entrada, o exercício profissional fica limitado a condições que, muitas vezes, não refletem critérios que, de fato, tornam a prática mais segura. O que ocorre é que grupos de interesse almejam uma fatia do mercado para seu exclusivo usufruto”.
O Dep. Pedro Westphalen (Progressistas/RS), em emenda apresentada pela Comissão de Saúde, discorda do autor do PL ao afirmar que “a existência de uma Lei regulamentando a profissão gera segurança jurídica para toda a sociedade, além da segurança jurídica ao trabalhador”.
Ao citar Frédéric Bastiat, o autor do PL parece estar de acordo com o economista francês quando este afirma que há: “[…] uma enorme massa de profissionais qualificados em busca de emprego e dispostos a oferecerem sua mão de obra proibidos de trabalharem por não atenderem aos critérios formais, que na grande maioria das vezes, não possuem correlação com a qualidade do serviço prestado”.
O tema é complexo e polêmico. Creio que os atores da formação acadêmica de profissionais para o exercício de profissões regulamentadas, as corporações e as sociedades dedicadas ao ensino devem construir diálogos colaborativos que posam contribuir para a separação do joio do trigo. A sugestão está lançada.