Blog do Prof. Dr. Paulo Cardim nº 563, 28 de novembro de 2022.

Constituição e República: conflitos

Reza o art. 2º da Constituição de 88 que os Poderes da União – Legislativo, o Executivo e o Judiciário -, são “independentes e harmônicos entre si”. A Constituição disciplina a competência e atribuições de cada Poder; um não pode interferir na área de competência do outro. Isso é cristalino e cláusula pétrea.

A Carta Magna, em seu art. 5º, diz que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade […]”. Entre esses direitos, realçamos os seguintes:  a “livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”, assim como “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”. O art. 220 determina que “a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição”. Já em relação aos parlamentares que compõem o Congresso Nacional, o art. 53 é cristalino: “Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos”. E o § 2º assegura que, “desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. Nesse caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 35, de 2001”.

Esse elenco de direitos, invioláveis pela nossa chamada “Constituição Cidadã”, está sendo desprezado e descumprido por várias decisões do Supremo Tribunal Federal. Atos que prendem deputados e jornalistas sem o devido processo legal, ao contraditório e à defesa. Algumas deliberações interferem diretamente na competência do Congresso Nacional e no Poder Executivo.

As deliberações do Supremo são irrecorríveis. A “Constituição Cidadã” está sendo interpretada para retirar direitos legítimos de cidadãos eleitos diretamente pelo povo, “em eleições livres e democráticas”, como alega o Tribunal Superior Eleitoral.

O Estado Democrático de Direito é o fundamento de nossa República. Contudo, está sofrendo, seguidamente, agressões por funcionários públicos federais que estão agredindo a nossa Lei Maior, quando deveriam respeitá-la. Trata-se de um conflito de Poderes que interfere negativamente nas atribuições do Congresso Nacional e do Poder Executivo. Como disse na postagem anterior, fere os direitos humanos, consagrados pela Declaração Universal da ONU e pela nossa Constituição

Essas ações vão de encontro ao Estado Democrático de Direito. Neste, o poder do Estado é limitado pelos direitos do cidadão. Uma de suas finalidades é coibir abusos do Estado para com os indivíduos. A cidadania é a protagonista absoluta. A soberania popular é que dá a legitimação aos legisladores e ao chefe do Poder Executivo, eleitos pelo povo em sufrágio direto. O art. 1º da Constituição é taxativo nesse contexto: “todo poder emana do povo”. O STF não tem essa chancela.

Vivemos numa democracia. Um regime às vezes contestado por políticos populistas ou de viés autoritário. Essas controvérsias sobre o regime democrático estão carimbadas com uma famosa frase do estadista Winston Churchill: “Ninguém pretende que a democracia seja perfeita ou sem defeito. Tem-se dito que a democracia é a pior forma de governo, salvo todas as demais formas que têm sido experimentadas de tempos em tempos” …

A quem recorrer? Essa é uma questão delicada, que exige diálogo entre os dirigentes dos Poderes da República, em momento tão delicado de nossa recente e ainda não consolidada República Democrática de Direito e o respeito à soberania popular.

Entre predicados e defeitos, a Democracia com D maiúsculo vai de conflito em conflito consolidando suas bases fundamentais. Essa é uma longa jornada, mas que será vitoriosa ao final. Os percalços vão conduzindo ao burilamento do Estado pelo povo e para o povo e à vigilância sobre os transgressores da Democracia, às vezes lobos em pele de carneiros.

“É admirável quanto pânico um homem honesto pode espalhar em meio a uma multidão de hipócritas”.

Thomas Sowell

 “O POVO PRECISA DE DUAS COISAS: LIBERDADE E EDUCAÇÃO.

LIBERDADE PARA PODER VOTAR. EDUCAÇÃO PARA SABER VOTAR”.