Blog do Prof. Dr. Paulo Cardim nº 625 de 13 de maio de 2024

Abolição da escravatura: uma luta (e vitória) dos liberais

Eu tenho um sonho que meus quatro pequenos filhos um dia viverão em uma nação onde não serão julgados pela cor da pele, mas pelo conteúdo do seu caráter. (Martin Luther King Jr.)

O fim da escravidão no Brasil completa 136 anos, neste 13 de maio. Em 1888, a princesa Isabel, com a aprovação de D. Pedro II, assinou a Lei Áurea, decretando a abolição da escravatura no Brasil. D. Pedro II era um estadista, vilipendiado pelas narrativas de historiadores sem compromisso com a História. A decisão veio após mais de três séculos de escravidão, que resultaram em 4,9 milhões de africanos traficados para o Brasil, sendo que mais de seiscentos mil morreram na viagem marítima para o Brasil.

A história registra que a primeira tentativa de abolir a escravidão indígena no Brasil data de 1611, durante o período colonial. Um luta que continuou até a abolição definitiva da escravatura pelo Marquês de Pombal ente 1755/1758, quando o rei José I governava Portugal. Outros movimentos abolicionistas surgiram no período colonial, como a Conjuração Baiana, em 1798.

Após a Independência do Brasil, em 1822, o movimento fortaleceu a atuação dos liberais, que começaram, na imprensa e no parlamento, a lutarem abertamente sobre a abolição da escravatura. Essa luta foi intensificada no Império, tornada relevante a partir de 1850. A partir de 1870, o tema já passou a ser abordado, com intensidade e disposição, por abolicionistas negros e brancos.

Deve-se reconhecer que a abolição da escravatura foi um processo complexo e envolveu diversos atores, incluindo abolicionistas brancos, negros, indígenas e outros grupos sociais. Foi uma luta dos brasileiros íntegros, livres, influenciados pelo que acontecia na Europa. Portugal e Espanha pensam que descobriram o Brasil e a América. O continente americano já possuía uma numerosa população de nativos. Portugal matou e tornou indígenas brasileiros seus escravos. A Espanha dizimou nações nativas, como os Incas, no Peru, uma civilização que dominava boa parte desse país, mais adiantada que os espanhóis. A prova são as ruínas de Machu Pichu. As ruínas mostram a progressão das técnicas de construção incas, começando com estruturas simples de pedra e evoluindo para blocos maciços finamente talhados que se encaixam como peças de quebra-cabeça. 

Dom Pedro II elaborou, em seu gabinete, projeto de lei, apresentado ao parlamento pelo ministro da Justiça, Eusébio de Queirós, que adotava medidas efetivas para a extinção do tráfico negreiro. Convertido na Lei nº 581, de 4 de setembro de 1850, seu artigo 3º determinava que: “O proprietário, o capitão ou mestre, o piloto, o barqueiro e o sobrecarregador são culpados do crime de importação ou tentativa de importação de escravos. Os tripulantes e os que ajudam na descarga de escravos em território brasileiro são cúmplices, assim como aqueles que contribuem para escondê-los do conhecimento da autoridade, ou para subtraí-los da apreensão no mar, ou no ato de descarregar e ser perseguido”.

Entre os abolicionistas brancos, podemos destacar José Bonifácio de Andrada e Silva (1763/1838), estadista, naturalista, poeta, conhecido como Patriarca da Independência do Brasil. Além da atuação política, a mineralogia mereceu a sua dedicada atenção e ação. Descobriu quatro minerais, incluindo a petalita que, mais tarde, levou à descoberta do elemento lítio e a andradita, assim denominada em sua homenagem. A Assembleia Constituinte de 1823 foi o palco de sua luta pela abolição da escravatura “câncer mortal que ameaçava os fundamentos da nação”.

O conselheiro Antônio Rodrigues Veloso de Oliveira foi uma das primeiras vozes abolicionistas. Ele chegou a propor, timidamente, que o comércio de escravos fosse restrito a dez anos e que os filhos de escravos nascidos no Brasil fossem considerados livres.

Entre a liderança negra, destacaram-se Luis Gama, nascido livre, mas escravizado pelo próprio pai, branco, aos 10 anos. Ele foi um dos melhores abolicionistas. Após fugir dessa condição aos 18 anos, tornou-se jornalista e advogado. Defendeu o direito de liberdade de mais de quinhentos negros e é considerado patrono da abolição da escravatura no Brasil.

1.     O engenheiro baiano André Rebouças foi um dos mais ativos no movimento abolicionista. Fundador da Sociedade Brasileira Contra a Escravidão, Rebouças é homenageado em uma avenida na capital paulista em uma das principais avenidas da cidade. Os irmãos Rebouças foram os primeiros engenheiros negros do Brasil.

  1. Conhecido como Dragão do Mar, o jangadeiro Francisco José do Nascimento era membro do Movimento Abolicionista do Ceará, primeiro estado a aderir, em 1884, à abolição da escravatura. Liderando uma greve em 1881, Nascimento conseguiu paralisar o tráfico de negros em Fortaleza por alguns dias.
  2. Entre as formas de resistência, estavam grandes embates parlamentares, manifestações artísticas, até revoltas e fugas massivas de escravos, que a polícia e o Exército não conseguiam — e, a partir de certo ponto, não queriam — reprimir. Em 1884, quatro anos antes do Brasil, os Estados do Ceará e do Amazonas acabaram com a escravidão, dando ainda mais força para o movimento.

A escravatura foi uma herança maldita de Portugal para o Brasil, que marca uma época de triste recordações. Trata-se de uma dívida social que os lusitanos jamais vão pagar.

    A mudança não virá se esperarmos por outra pessoa ou outros tempos. Nós somos aqueles por quem estávamos esperando. Nós somos a mudança que procuramos. (Barack Obama)